segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Pedras e muros

O lendário grupo musical Pink Floyd editou, em 1979, um álbum de ópera rock que viria a ser um best-seller mundial com mais de 30 milhões de cópias vendidas. «The wall», ou o «O muro» era a história da vida de um anti-herói chamado Pink, o qual era constantemente deitado por terra por parte da sociedade. Para se proteger dessa sociedade que constantemente o desvaloriza, Pink foi construindo um muro imaginário criando a sua zona de segurança. Cada má experiência que tinha na vida era «mais um tijolo no muro». E, pouco a pouco, Pink foi tomando consciência da necessidade de derrubar o seu muro e abrir-se ao mundo que o rodeava. Era Rousseau que se referia ao facto de que o homem nasceu livre mas em todos os lugares estava acorrentado. Muros individuais, interiores, que referimos agora, dão origem a estes muros colectivos, exteriores que referimos de seguida.

Sobre uma tribuna colocada em frente ao muro de Berlim, o ex-presidente americano Ronald Reagan lançou um corajoso repto ao então presidente soviético Mikhail Gorbachev e que viria a ser uma das frases mais relevante do século: «Mr. Gorbachev tear down this wall» ou «Senhor Gorbachev, derrube este muro». Alguns anos mais tarde, em 1989, o muro de Berlim foi derrubado pondo fim a um período que a História apelidou de «guerra-fria». Esse facto fez nascer uma grande esperança no coração dos homens quanto à capacidade que começavam a demonstrar em destruir barreiras ideológicas, políticas, sociais, económicas e outras. Faz hoje 20 anos.

Já não é politicamente correcto construir ou manter muros. Hoje vivemos num imenso open space onde a palavra de ordem é livre acesso. As fronteiras tendem a desaparecer, dando lugar a espaços abertos de livre circulação. O conceito de Platão acerca de fronteiras e limites já está, por isso, desajustado. Era Platão que falava com grande reverência de Zeus Herkeios, o deus protector das fronteiras e chamava divinos aos horois, os limites entre os estados

Hoje, vivemos na era da partilha de informação, da miscigenação cultural, do intercâmbio. Tal como acontece com o processo da polinização cruzada, em que o vento transporta o pólen de uma flor para outra enriquecendo o património genético da flor receptora, assim também existe hoje uma polinização cruzada entre povos e culturas, dando origem a novas identidades. Como resultado disso, o mundo está cada vez mais pequeno e mais semelhante. As diferenças tendem a esbater-se e a dar lugar à formação da tão falada cultural global, uma espécie de mundo Mac Donald’s. Globalização é a palavra de ordem que reflecte esta nova atitude de demolição de muros, esbatimento das diferenças e aproximação entre os homens.

A muralha da China é, segundo dizem, a única estrutura feita pelo homem que é visível a partir da Lua. Observado a partir do espaço, o homem poderia ser definido como um construtor de muros. E neste dia de celebração da queda do muro de Berlim, vale a pena pensar que os homens constroem muros não tanto com as pedras que desenterram mas som com as pedras que lhes são arremessadas. O desafio continua.

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