sexta-feira, 25 de junho de 2010

Já são horas de me levantar

A minha filha, fã incondicional da cultura e sociedade nipónicas, mostrou-me há dias este provérbio japonês: cair sete vezes, levantar-se oito».

Na «Gaia Ciência», Nietzsche descreve o niilismo desta forma: «Para onde vamos nós próprios? Não estaremos incessantemente a cair? Para diante, para trás, para o lado, para todos os lados?».

A ideia de «queda», nas suas múltiplas dimensões, marca tragicamente a vida do homem. Mas este não é um conceito aplicado só à vida no plano pessoal; é também no plano cósmico. O mito de criação babilónico, por exemplo, apresenta-nos a criação a partir de um quadro de profunda violência e desordem – de queda. É o corpo dilacerado da deusa que dá origem ao universo e do seu sangue surgem as constelações. O mito judaico da criação também apresenta a formação dos mundos a partir de um estado de queda: é a criação que surge a partir de um cenário de vacuidade e de caos disforme.

É um facto: somos habitados – tragicamente habitados – por uma propensão para a queda. E o facto de estarmos «incessantemente a cair», como dizia Nietzsche, torna o homem um ser decadente! O segredo, contudo, está em ter uma queda controlada para minimizar os danos e optimizar, afinal, a vida.

Cada passo em frente é também uma queda! Andamos e caímos. Mas por incrível que pareça, a vida também se forja, também se ergue, também se vive a partir das quedas.

Já são horas de me levantar

2 comentários:

William disse...

Nada como a queda na arte, nada como o humano e o ídolo que sucumbe. Para mim, desde que a queda seja uma arte, válida é, e "paidéica", ensinadora de princípios, mas como Wilde, a arte não deve ensinar, deve fruir, mas como a mim, a arte deve amenizar a dor e viver per se, se caindo, caindo com arte. O pior é quando a queda é sanguínea, é quando a volta é quase impossível, é quando se trata de arfantes seres. Talvez aí resida o mais belo e o mais trágico, quero fazer parte da humanidade que se superou no mais belo: cego para amar. Abraços. Belo Horizonte. Brasil.

Luís Melancia disse...

Gostei...«se caindo, caindo com arte.».